terça-feira, 29 de março de 2011

FICHAMENTO DO CAP. VIII DO LEVIATÃ



AS VIRTUDES CHAMADAS INTELECTUAIS E OS DEFEITOS CONTRÁRIOS A ESTAS

Definição da virtude intelectual – O talento, natural ou adquirido – O talento natural – O bom talento, ou imaginação – O bom juízo – A descrição – A prudência – A habilidade – O talento adquirido – A leviandade – A loucura – A raiva – A melancolia – A linguagem insignificante.

- Se todas as coisas fossem iguais em todos os homens nada seria apreciado. (p. 58).
- Por virtudes intelectuais sempre se entende aquela capacidade do espírito que os homens elogiam, valorizam e desejariam possuir em si mesmos. Vulgarmente recebem o nome de talento natural, embora a mesma palavra talento também seja usada pra distinguir das outras uma certa capacidade. (p. 58).
- São de duas espécies essas virtudes: naturais e adquiridas. Por naturais não entendo as que um homem possui de nascença, pois isso é apenas sensação, pela qual os homens diferem tão pouco uns dos outros [...] Quero referir-me àquele talento que se adquire apenas através da prática e da experiência, sem método, cultura ou instrução. Este talento natural consiste principalmente em duas coisas: celeridade – isto é, rapidez na passagem de um pensamento a outro e firmeza de direção para um fim escolhido. (p. 58).
- Tal diferença de rapidez é causada pela diferença das paixões dos homens, que gostam e detestam uns de uma coisa, outros de outras. (p. 58).
- Daqueles que observam suas diferenças e dissimilitudes, ao que se chama distinguir, discernir e julgar entre coisas diversas, nos casos em que tal discernimento não seja fácil, diz-se que têm um bom juízo. (p. 59).
- [...] a imaginação, quando não é acompanhada de juízo, não se recomenda como virtude. [...] o juízo e descrição, recomenda-se por si mesma, sem a ajuda da imaginação. (p. 59).
- Sem firmeza e direção para um fim determinado, uma grande imaginação é um espécie de loucura [...] (p. 59).
- O juízo deve ser predominante num bom livro de história, porque a excelência da obra consiste no método e na verdade, assim como na escolha das ações que é mais proveitoso conhecer. A imaginação não tem lugar aqui, a não ser para ornamentar estilos. (p. 60).
- A imaginação é predominante nas orações laudatórias e nas invectivas, porque o objetivo não é a verdade, mas a honra ou a desonra, o que é feito mediante nobres ou vis comparações. O juízo se limita a sugerir quais as circunstâncias que tornam uma ação louvável ou condenável. (p. 60).
- [...] em toda busca rigorosa da verdade o juízo faz tudo. A não ser que por vezes o entendimento tenha de ser ajudado por uma semelhança adequada, havendo nesse caso um uso da imaginação. (p. 60).
- Quanto às metáforas, nesse caso estão completamente excluídas. Sabendo que elas abertamente professam a simulação, admiti-las no conselho e no raciocínio seria manifesta loucura. (p. 60).
- Os secretos pensamentos de cada pessoa percorrem todas as coisas, sagradas ou profanas, limpas ou obscenas, sérias ou frívolas, sem vergonha ou censura. Coisa que o discurso verbal não pode fazer, limitado pela aprovação do juízo quanto ao momento, ao lugar e à pessoa. (p. 60).
- É na falta de discrição que reside a diferença. (p. 60).
- [...] quando há falta de talento não é a imaginação que falta, mas a discrição. O juízo sem imaginação é talento, mas a imaginação sem juízo não o é. (p. 61).
- Governar bem uma família ou um reino não corresponde a diferentes graus de prudência, mas a diferentes espécies de ocupação, do mesmo modo que desenhar um quadro pequeno, grande ou em tamanho maior que o natural, não corresponde a diferentes graus de arte. (p. 61).
- Caso à prudência se apresentar o uso de meios injustos ou desonestos [...] temos aquele perverso talento a que se chama astúcia. (p. 61).
- A magnanimidade é o desprezo pelos expedientes injustos ou desonestos. (p. 61).
- Com relação ao talento adquirido – ou seja, adquirido por método e instrução – o único que existe é a razão, que assenta no uso correto da linguagem, e da qual derivam as ciências. (p. 61).
- Residem nas paixões as origens das diferenças de talentos. A diferença das paixões deriva em parte da diferente constituição do corpo e em parte das diferenças de educação. (p. 61).
- [...] paixões [...] são diferentes não apenas por causa das diferenças de constituição dos homens, mas também por causa das diferenças de costumes e educação entre estes. (p. 62).
- [...] a riqueza, o saber e a honra não são mais do que diferentes formas de poder. (p. 62).
- Os pensamentos são para os desejos como batedores, ou espias, que vão ao exterior procurar o caminho para as coisas desejadas. É daí que provem toda a firmeza do movimento do espírito, assim como toda a rapidez deste. [...] não ter nenhum desejo é o mesmo que está morto. Ter por qualquer coisa paixões mais fortes e veementes do que geralmente se verifica nos outros é aquilo que os homens chamam loucura. (p. 62).
- [...] o dano e indisposição dos órgãos são causados pela veemência ou pelo extremo prolongamento da paixão. (p. 62).
- Sobre a paixão, cuja violência ou prolongamento provoca a loucura, é uma grande vanglória, a que vulgarmente se chama orgulho ou auto-estima, e é um grande desalento do espírito. (p. 62).
- O que torna os homens sujeitos à cólera é o orgulho, cujo excesso é a loucura chamada raiva ou fúria. Dessa forma ocorre que o excessivo desejo de vingança, quando se torna habitual, prejudica os órgãos e se transforma em raiva. O amor excessivo, junto ao ciúme, também se transforma em raiva. (p. 62).  
- A veemente convicção da verdade de alguma coisa, quando contrariada pelos outros, também se transforma em raiva. (p. 63).
- O que provoca no homem receios infundado é o abatimento, que constitui uma loucura vulgarmente chamada melancolia, a qual se manifesta em diversas condutas: visita a cemitérios e lugares solitários, atos de superstição e medo de alguém ou de alguma coisa determinada. Resumindo, todas as paixões que provocam comportamentos estranhos e invulgar são designadas pelo nome de loucura. (p. 63).
- Se os excessos são loucuras, não resta dúvida de que as próprias paixões, quando tendem para o mal, constituem outros tantos graus de desequilíbrio. (p. 63).
- [...] a loucura não é mais do que o excesso de manifestação da paixão [...]. A variedade da conduta dos homens que bebem demais é a mesma que a dos loucos, uns enraivecendo-se, outros amando, outros rindo, tudo isso de maneira extravagante, mas conformemente às varias paixões dominantes. (p. 64).
- As escrituras foram escritas para mostras aos homens o reino de Deus e preparar seus espíritos para se tornarem seus súditos obedientes, deixando o mundo e a filosofia a ele referente às disputas dos homens, pelo exercício de sua razão natural. (p. 66).
- Por espíritos sempre se entendem coisas que, sendo incorpóreas, podem, contudo, ser movidas de um lugar a outro. (p. 68).


FICHAMENTO DO CAP. VII DO LEVIATÃ





SOBRE OS FINS OU RESOLUÇÃO DO DISCURSO

O juízo ou sentença final – A dúvida – A ciência – A opinião – A consciência – A crença – A fé

- Em todo discurso, governado pelo desejo de conhecimento, há pelo menos um fim, quer seja para conseguir ou evitar alguma coisa. Onde quer a cadeia de discurso seja interrompida existe um fim provisório. (p. 55)
- Se for apenas mental, o discurso consistirá em pensamentos de que uma coisa será ou não, de que ela foi ou não foi, alternadamente. (p. 55).
- Tal como o último apetite na deliberação se chama vontade, assim também, a última opinião na busca da verdade sobre o passado e o futuro chama-se juízo, ou sentença final e decisiva daquele que discursa.  (p. 55).
- [...] o conjunto da cadeia de opiniões alternadas, quanto ao problema da verdade e da falsidade, se chama dúvida. (p. 55).
- [...] nenhuma espécie de discurso pode terminar no conhecimento absoluto dos fatos passados ou vindouros. Porque para o conhecimento dos fatos é necessário primeiro a sensação e depois disso a memória, e o conhecimento das conseqüências, que acima já disse chamar-se se ciência, não é absoluto, mas condicional. (p. 55).
- Ninguém pode saber, por meio do discurso, que isto ou aquilo é, foi ou será, o que equivale a conhecer absolutamente. É possível apenas saber que, se isto é, aquilo também é; que, se isto foi, aquilo também foi; e que se isto será, aquilo também será; o que equivale a conhecer condicionalmente. (p. 55-56).
- Quando o discurso é expresso por meio da linguagem, portanto, começa pela definição das palavras e procede mediante a conexão destas em afirmações gerais, e posteriormente em silogismos. O fim ou soma total é chamado de conclusão. (p. 56).
- Se o primeiro terreno desse discurso não forem as definições, ou se as definições não forem corretamente ligadas em silogismos, nesse caso o fim ou conclusão volta a ser opinião acerca da verdade de algo afirmado, embora as vezes em palavras absurdas e destituída de sentido, sem possibilidades de serem compreendidas. (p. 56).
- [...] o testemunho da consciência tem sido sempre atendido com a maior diligencia em todos os tempos. Depois passou-se a usar metaforicamente a mesma palavra, indicando o conhecimento dos fatos secretos e pensamentos secretos de cada um, sendo portanto metaforicamente que se diz que a consciência equivale a mil testemunhas. (p. 56).
- [...] os homens, veementemente apaixonados por suas opiniões por mais absurdas que fossem, e obstinadamente decididos a mantê-las, deram também a essas opiniões o reverenciado nome de consciência, como se pretendessem ilegítimo mudá-las ou falar contra elas. Dessa forma pretende saber que estão certos, quando no máximo sabem que pensam estar. (p. 56).
- Na crença há duas opiniões, uma relativa ao que a pessoa diz, e outra relativa à sua virtude. Acreditar, ter fé em, ou confiar em alguém, tudo isso significa a mesma coisa: a opinião da veracidade de uma pessoa. Acreditar no que é dito, significa apenas uma opinião da verdade da coisa dita. (p. 57).
- No Credo, “crer em” não significa confiar na pessoa e, sim, na confissão e aceitação da doutrina. (p. 57).
- [...] quando acreditamos que qualquer espécie de afirmação é verdadeira, com base em argumentos que não são tirados da própria coisa, nem dos princípios da razão natural, mas são tirados da autoridade de quem fez essa afirmação, neste caso o objeto de nossa fé é o orador ou a pessoa em quem acreditamos, ou em quem confiamos e cuja palavra aceitamos; e a honra feita ao acreditar é feita apenas a essa pessoa. Consequentemente, quando acreditamos que as Escrituras são a palavra de Deus, sem ter recebido qualquer revelação imediata do próprio Deus, o objeto de nossa crença, fé e confiança é a igreja, cuja palavra aceitamos e à qual aquiescemos. (p. 57)
- Aqueles que acreditam naquilo que um profeta lhes diz em nomes de Deus aceitam a palavra do profeta, honram-no e nele confiam e crêem, aceitando a verdade do que ele diz, quer se trate de um verdadeiro ou falso profeta. (p. 57).   
- [...] seja o que for que acreditarmos tendo como única razão para tal a que deriva apenas da autoridade dos homens e de seus escritos, que eles tenham sido ou não enviados por Deus, nossa fé será apenas fé nos homens. (p. 58).

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