segunda-feira, 15 de novembro de 2010

FICHAMENTO DO CAP. VI DO LIVRO “O MAL-ESTAR DA PÓS-MODERNIDADE”


 
BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Trad. Mauro Gama, Claudia Martinelli Gama. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 1998.


TURISTAS E VAGABUNDOS: OS HERÓIS E AS VÍTIMAS DA PÓS-MODERNIDADE

- As teorias tendem a ser incipientes claros e bem talhados feitos para receber os conteúdos limosos e lamacentos da experiência. Mas para conservá-los aqui, suas paredes precisam ser duras; tendem também a ser opaca. É difícil ver os conteúdos da experiência através das paredes da teoria. Muitas vezes se tem de furar as paredes – “desconstrua-las”, “decompô-las” – para ver o que elas escondem. (P. 106).
- Em seu papel tradicional de purificadores e legisladores do senso comum, os filósofos deviam cortar e separar suas práticas das práticas do homem comum, de modo que pudessem ser colocadas umas contra as outras. Dessa operação, as práticas do não-filósofos emergiam, é claro, como não-filosóficas. (P. 108).
- [...] apenas sob certas condições [...] as coisas realmente se tornam evidentes. (É evidente para nós, por exemplo, que já os homens de Cro-Magnon e os de Neanderthais “deviam ter tido uma cultura”, mas só na segunda metade do século XVIII pode o conceito de cultura ser cunhado, e eles dificilmente seriam os homens de Cro-Magnon e os Neanderthais que foram, se estivesse conscientes de que tinham uma cultura.). (P. 109).
- [...] os homens e mulheres modernos viveram num tempo-espaço com estrutura, um tempo-espaço rijo, sólido e durável, mas também um duro recipiente em que os atos humanos podiam achar-se sensíveis e seguros. Nesse mundo estruturado, uma pessoa podia perder-se, mas também podia achar seu caminho. (P. 110).
- Sob tais circunstancias, a liberdade era de fato a necessidade conhecida. (P. 110).
- A estrutura estava em seu lugar antes de qualquer proeza humana começar, e durava o tempo suficiente, inabalável e inalterada, para levar a cabo a proeza. Ela antecedeu toda realização humana, mas também a realização possível [...]. (p. 111).
- O que pensamos que o passado tinha é o que sabemos que não temos. (P. 111).
- E o que sabemos que não temos é a facilidade de retirar a estrutura do mundo da ação dos seres humanos; a solidez firme, de pedra, do mundo exterior à flexibilidade da vontade humana. Não que o mundo se tenha tornado subitamente submisso e obediente ao desejo humano [...]. (P. 112).
- A ação humana não se torna menos frágil e errática: é o mundo em que ela tenta inscrever-se e pelo qual procura orientar-se que se torna mais assim. (P. 112).
- Como pode alguém investir numa realização de vida inteira, se hoje os valores são obrigados a se desvaloriza, e a manhã a se dilatar? (P. 112).
- O significado da identidade [...] se refere tanto a pessoas como coisas. O mundo construído de objetos duráveis foi substituído pelos produtos disponíveis projetados para imediata obsolescência. Num mundo como esse, as identidades podem ser adotadas e descartadas como uma troca de roupa. O horror da nova situação é que todo diligente trabalho de construção pode mostrar-se inútil. (P. 112).
- No jogo da vida dos homens e mulheres pós-modernos, as regras do jogo não param de mudar no curso da disputa. A estratégia sensível, portanto, é manter curto cada jogo [...]. (P. 113).
- [...] a determinação de viver um dia de cada vez, e de retratar a vida diária como uma sucessão de emergências menores, se tornaram os princípios normativos de toda estratégia de vida racional. (P. 113).
- Manter o jogo curto significa tomar cuidado com os compromissos a longo prazo. Recusar-se a se “fixar” de uma forma ou de outra. Não se prender a um lugar, por mais agradável que a escala presente possa parecer. (P. 113).
- [...] a dificuldade já não é descobrir, inventar [...] uma identidade, mas como impedi-la de ser demasiadamente firme e de aderir depressa demais ao corpo. (P. 113).
- O eixo da estratégia de vida pós-moderna não é fazer a identidade deter-se – mas evitar que se fixe. (P. 113).
- Os turistas se tornam viajantes e colocam os sonhos da nostalgia acima das realidades da casa [...]. (P. 117).
- Nem todos os viajantes estão em movimento por preferirem ficar em movimento a estar em seu lugar. [...] Se estão em movimento, é porque foram impelidos por traz – tendo sido, primeiramente, desenraizados por uma força demasiadamente poderosa, e muitas vezes demasiadamente misteriosa [...]. (P. 117).
- Para eles, estar livre significa não ter de viajar de um lado para o outro. [...] São esses os vagabundos, luas escuras que refletem o brilho de sóis brilhante, os mutantes da evolução pós-moderna [...]. Os vagabundos são o resto do mundo que se dedicaram aos serviços dos turistas. (P. 117).
- Os vagabundos, porem, sabem que se não ficarão por muito tempo, por mais intensamente que o desejem, uma vez que em lugar nenhum que parem são bem-vindos: se os turistas se movem porque acham o mundo irresistivelmente atrativo, os vagabundos se movem porque acham o mundo insuportavelmente inóspito. (P. 117-118).
- Os turistas viajam porque querem; os vagabundos, porque não têm nenhuma outra escolha. Os vagabundo, pode-se dizer, são turistas involuntários. (P. 118).
- [...] turistas e vagabundos são as metáforas da vida contemporânea. Uma pessoa pode ser um turista ou um vagabundo sem jamais viajar fisicamente para muito longe [...]. (P. 118).
- [...] em nossa sociedade pós-moderna, estamos todo [...] em movimento; nenhum de nós pode estar certo de que adquiriu o direito a algum lugar uma vez por todas, e ninguém acha que sua permanecia num lugar, para sempre, é uma perspectiva provável. (P. 118).
- [...] aqui termina o que há de comum na nossa situação e começam as diferenças. (P. 118).
- Quanto mais liberdade de escolha se tem, mais alta a posição alcançada na hierarquia social da pós-moderna. (P. 118).

Nenhum comentário:

Postar um comentário

quick search